Por meio da publicação de um “Esclarecimento sobre Itaúsa”, a diretoria da PETROS tenta justificar a compra com ágio, em leilão realizado na BOVESPA em 30 de dezembro de 2010, de uma carteira de aproximadamente 192 milhões de ações ON da Itaúsa (ITSA3) pertencente à Camargo Corrêa. No mesmo leilão foram adquiridas de outros ofertantes cerca de 21 milhões de ações . O total adquirido nesse evento envolveu cerca de 12,7% do capital votante da Itaúsa. Aquisições posteriores fizeram com que, em janeiro de 2014, essa participação atingisse 15% desse capital, percentual-alvo definido pelo Conselho Deliberativo da Petros como condicionante à aprovação do investimento.
O conteúdo da publicação está longe de esclarecer o impacto negativo que esse negócio acarretou às finanças da PETROS. Ao contrário, tenta iludir os participantes, fazendo defesa de um negócio que a própria PREVIC, órgão responsável pela fiscalização das Entidades Fechadas de Previdência Complementar, já condenou, inclusive com punição de um dos responsáveis.
O simples fato de omitir essa condenação no “Esclarecimento” já seria suficiente para colocar por terra a consistência da publicação. Mas o documento contém graves mistificações que devem, a bem da verdade, ser devidamente desconstruídas.
Vamos ao texto:
“A compra de ações da Itaúsa foi realizada após um ano de análise, com base no desempenho histórico da empresa, expectativas de crescimento do setor bancário… e a concretização do negócio envolveu inúmeras análises e estudos necessários à decisão da Petros.”
A análise do desempenho pregresso da empresa revelaria de imediato que o histórico de distribuição de proventos da Itaúsa ficava muito abaixo da meta atuarial.
O sucesso da aplicação dependeria totalmente da valorização do papel no mercado. Na época, o mercado de ações recém havia ultrapassado um pico histórico de alta. Havia temores quanto a dificuldades econômicas na zona do Euro. A previsão para os mercados era de queda, o que efetivamente se concretizou. Sem perspectiva de obter a meta atuarial com os proventos, adquirindo as ações num momento imediatamente posterior ao maior pico já atingido pelo IBOVESPA e com cenário de queda pela frente (queda que, aliás, já se ensaiava), o risco de não ter o retorno exigido pela meta atuarial era evidente.
É de estranhar também que as “inúmeras análises” não tenham revelado que a imensa carteira que estava sendo comprada, correspondendo a 6,6% do patrimônio da PETROS na época, não tinha qualquer liquidez. Num plano maduro como é o PPSP, liquidez é fundamental.
Não há como disfarçar, enfim, que o negócio Itaúsa, pela baixa liquidez, pela insuficiência de proventos, e pelo alto risco decorrente da conjuntura em que foi realizado não se enquadrava nos critérios que devem nortear as aplicações de um plano maduro como o PPSP.
“O desempenho das ações foi positivo em +3,8% em 2011, +14,4% em 2012 e +0,4% em 2013… em 2014… foi de -12,3%.”
Este é um exemplo acabado de como, omitindo fatos, pode-se dizer verdades e, ao mesmo tempo, mistificar a realidade. Um dos fatos omitidos é que o desempenho não considera a inflação incidente sobre o valor pago originalmente pela ação. Os números publicados representam apenas a variação da cotação entre o início e o fim do exercício. O outro fato omitido é que a PETROS pagou no leilão valor acima do mercado, R$14,48 por unidade, o que invalida o número referente a 2011. Fazendo os devidos ajustes, o resultado é o seguinte:
Ano | Valor pago corrigido | Cotação em 30/12* | Desempenho anual |
2011 | 15,42 | 14,40 | -6,6% |
2012 | 16,32 | 15,93 | -2,4% |
2013 | 17,29 | 15,37 | -11,1% |
2014 | 18,39 | 12,91 | -29,8% |
*inclui efeito das bonificações em ações.
Portanto, ao contrário do que o texto sugere, não houve uma trajetória de ganhos até 2013, com perda parcial em função da crise em 2014. As perdas foram continuadas desde o início do negócio, e culminaram em 2014 com o preocupante percentual de 29,8%. As perdas potenciais por desvalorização real do ativo até dezembro de 2014 eram, em dinheiro da época, de R$921 milhões, isso considerando somente o lote adquirido no leilão. Essa perda representa 15% do déficit em dezembro de 2014.
“Desde 2011, a Companhia já distribuiu R$8,5 bilhões em proventos… evidenciando sua capacidade de geração de lucro”.
Ninguém duvida da capacidade de geração de lucro do setor bancário brasileiro. O importante, no entanto, é verificar se a parcela distribuída aos acionistas é vantajosa em relação a outras opções de investimento. Considerando que a PETROS iniciou 2011 com uma participação de 4,9% no capital total da Itaúsa, o lote inicial adquirido por 3,09 bilhões de reais rendeu 417 milhões de reais. Um investimento de mesmo valor que atingisse a meta atuarial teria rendido no período 863 milhões de reais, mais do que o dobro do rendimento de Itaúsa. Um exemplo de investimento que renderia a meta atuarial são as Notas do Tesouro que foram vendidas para comprar essas ações, no montante aproximado de 2,6 bilhões de reais. Elas, sozinhas, teriam proporcionado 309 milhões de reais a mais em rendimentos do que os 3,09 bilhões em ações da Itaúsa, cuja deficiência em proventos justifica mais 7,2% do déficit em dezembro de 2014.
“A participação da Petros em Itaúsa equivale a 15% do seu capital votante… que conferem à Petros o direito de eleger um membro para o Conselho de Administração e um membro para o o Conselho Fiscal da Companhia. Desta forma… tem um diferencial no que diz respeito à atuação sobre a governança corporativa e fiscalização da Itaúsa.”
O objetivo subjacente a esse parágrafo é justificar o injustificável, qual seja o pagamento de ágio travestido de prêmio de controle na aquisição dos lotes da Camargo Corrêa e outros no leilão de dezembro de 2010.
Em primeiro lugar, para participar do conselho fiscal não cabe pagar nenhum prêmio de controle. Basta ter o número de ações que dá esse direito, e não é necessário que sejam ações com direito a voto. Participar do conselho fiscal nunca é um objetivo, mas uma consequência, um direito adquirido pelo fato de obter uma participação de determinada relevância no capital da Companhia.
Em segundo lugar, o “diferencial” na atuação sobre a governança só existe de fato e de direito através da participação no controle, via inclusão no acordo de acionistas. Fora isso, é – com o perdão da palavra – pura balela. Ou bem o acionista participa do controle ou não influi no governo da Companhia. A Petros não participa do controle da Itaúsa, embora tenha pago por isso um valor que, atualizado, anda em torno de 500 milhões de reais. Portanto pagou pelo que não tem – e, na verdade,nem pretendia: a correspondência que enviou à Itaúsa em janeiro de 2011 (DIFI 003/11) é taxativa no seu parágrafo 3, inclusive em anular qualquer sentido defensável da exigência do Conselho Deliberativo de que a Petros deveria ter acesso a uma cadeira no Conselho de Administração da Companhia:
”3. O objetivo da aquisição da participação societária visa o investimento de longo prazo na ITAUSA para obter ganhos financeiro provenientes de seu crescimento esperado e, não tem como objetivo alterar a composição do controle ou a estrutura administrativa da Sociedade.”
As perdas efetivas e potenciais desse negócio representam, como visto acima, aproximadamente 22% do déficit total do PPSP declarado em dezembro de 2014, isso considerando somente o lote inicial de ações adquirido em 30 de dezembro de 2010.
A operação já foi considerada como eivada de irregularidade pela PREVIC . Um dos envolvidos já sofreu punição.
Frente a esses fatos irretorquíveis, fazer a defesa desse negócio é algo incompreensível à luz da ética e da boa governança, e dá a impressão de que se está tentando proteger preventivamente outros atores.
Faria muito melhor a diretoria da Petros, no sentido de recuperar a confiança dos participantes no futuro da Fundação, se viesse até nós para reconhecer com clareza os erros passados e assumir o compromisso de não mais realizar negócios motivados por interesses diversos dos estritamente relacionados ao interesse da Fundação.
Raul Corrêa Rechden
Matr. Petros 018.669
04/11/2015
Do site discrepantes.com.br
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